Estamos em comemorações da semana
mundial do brincar, iniciativa da Aliança pela Infância desde 2009 e o que
queremos é ver em todos os cantos do país a mobilização de pessoas para o
incentivo e o fomento da importância do brincar para nossas crianças.
Há dois
anos tive a oportunidade de participar de um projeto voltado para a promoção e
defesa do direito de brincar. Durante doze meses fazemos uma imersão profunda em uma proposta educativa totalmente transformadora.
Dessa experiência nasceu um
artigo, que é o material que compartilho aqui. Espero que gostem e que possa contribuir
de alguma forma:
As crianças vivem em uma sociedade que está em
constantes e profundas transformações. As mudanças sociais fazem com que novos
valores surjam em detrimento de outros que se configuram para responder às
necessidades dos diferentes grupos. Vale ressaltar que quando falamos em
crianças, as intuições, setores, segmentos e grupos sociais devemos compreender
uma nova (re)configuração para considerarmos nas discussões sobre a importância
da infância.
Reconhecer a criança cidadã, como sujeito de
direitos, e a infância como uma categoria social, é desenvolver ações que
efetivem aquilo que a lei assegura, em especial o desenvolvimento de políticas
públicas para o direito ao brincar. O artigo 227 da Constituição Federal de
1988 e o artigo 16 do Estatuto da Criança e Adolescente também trazem em seu
escopo a documentação da garantia dos direitos da criança, dentre eles o
direito ao brincar.
A primeira normativa que atribui direito às
crianças e adolescentes nasce com a Declaração de Genebra de 1924, documento no
qual é assegurado à crianças e adolescentes o direito à proteção. Essa
normativa é ampliada na Declaração Universal dos Direitos da Criança (DUDC) de
1959. O artigo 31 da DUDC fundamenta, reconhecidamente enquanto direito, o
brincar. Porém a consciência sobre esse direito precisa ser ampliada por meio
de propostas que qualifiquem o processo de desenvolvimento da criança e o
fortalecimento das ações sociais, para que ocorram profundas mudanças nas
políticas públicas, no contato com a natureza e na segurança das crianças para
que as promoções de seus direitos tenham investimentos adequados à sua
execução.
Ao mencionarmos os adultos, relembramos que o papel
da família e as mudanças em sua configuração, trouxeram novos papéis para os
atores sobre as questões a serem pensadas tanto pela família, quanto pela
sociedade. A criança que antes tinha tempo, liberdade e espaços variados para
brincar, agora passa a ocupar, cada vez mais cedo, um lugar fixo e
institucionalizado, onde passa a maioria do seu tempo. Por ser
institucionalizado esse espaço tem como premissa o papel de cuidar e ensinar.
Por outro lado, algumas famílias substituem a falta de tempo, pelo computador e
pelo vídeogame. Diante dessa nova realidade surgem questões que suscitam
profundas reflexões acerca da função da família e da Educação Infantil na
responsabilidade pela criança. Qual é o papel da família e o papel da mídia
eletrônica, diante do pouco tempo e da ausência de espaços com qualidade para
que a criança possa brincar? Quais são os benefícios e os malefícios de
oferecer à criança (somente) brinquedos tecnológicos e de multimídias?
O brincar e as mídias podem possibilitar o
desenvolvimento cognitivo, o da subjetividade, do raciocínio e da imaginação.
Contudo, o excesso do tempo dedicado ao uso das plataformas digitais prejudica
as oportunidades da criança de recrear-se e participar de atividades lúdicas e
artísticas. Ressaltamos também que corporalmente, a criança está passiva e
exposta podendo prejudicar a integridade da sua saúde. Segundo o Plano Nacional
pela Primeira Infância: “Quando uma criança brinca, ela entra em
contato com suas fantasias, desejos e sentimentos, conhece a força e os limites
do próprio corpo e estabelece relações de confiança com o outro” (2010,
p. 52). Além do crescimento subjetivo, a criança está também em constante
evolução biológica. O corpo é um registro vivo das ações do indivíduo
sobre a vida e sobre o mundo e também das ações da vida e do mundo sobre o
indivíduo. O corpo é presença, é por meio dele que a criança se apresenta ao
outro e à existência. Se o corpo representa a criança diante da vida, ele
precisa estar submerso nas diversas situações desafiadoras e promotoras de
desenvolvimento, não em detrimento à expansão do subjetivo, mas contemplando a
ideia de que, enquanto linguagem específica, o brincar, em suas diversas
manifestações e dialetos brincantes é desafiador e fomenta o (des)envolvimento
da criança em toda a sua integralidade.
Brincar de corpo inteiro é meio e fim, é o ponto de
encontro da criança com ela mesma e com seus pares, é o ponto da resolução de
seus conflitos e do confronto com seus medos, é o fio que desata os segredos e
os mistérios da vida e das coisas. Brincar de corpo inteiro é o movimento
dialógico, próprio das infâncias, que possibilita descobertas e aprendizados, é
o alimento do imaginário e o desdobramento do desenvolvimento biológico e motor
que está para além da própria “fisio lógica”. É uma dança externa
que também organiza a internalização das coisas e dos saberes. Brincar de corpo
inteiro é fazer desse corpo em desenvolvimento o templo de uma essência latente
e vivaz.
(Por Leandro Aparecido da Silva)
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